Informação consta do relatório ‘Focus’, divulgado nesta segunda (6) pelo BC. Meta de inflação de 2022 é de 3,5% e será cumprida se oscilar entre 2% e 5%; mercado já projeta 5,02%.

(crédito: Marcello Casal Jr Agência Brasil)

O ano de 2022 nem começou e o mercado financeiro financeiro já prevê que a meta de inflação será ultrapassada.

Na última semana, os analistas dos bancos elevaram sua estimativa para Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 5% para 5,02% em 2022.

A previsão, resultado de coleta do Banco Central com mais de 100 instituições financeiras na semana passada pelo Banco Central, foi divulgada nesta segunda-feira (6).

Com isso, os economistas preveem o estouro da meta de inflação pelo segundo ano seguido. No ano que vem, a meta central de inflação é de 3,5% e será oficialmente cumprida se o índice oscilar de 2% a 5%.

A meta de inflação do ano que vem foi definida em 2019 pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), colegiado formado, na ocasião, pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto, e pelo então secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues Júnior — que deixou recentemente o governo.

Inflação de 2021
Em 2021, o centro da meta de inflação em 2021 é de 3,75%. Pelo sistema vigente no país, será considerada cumprida se ficar entre 2,25% e 5,25%.

Mas, com a inflação superando 10,7% em doze meses a prévia de novembro, o próprio BC já admitiu oficialmente que a meta não será cumprida neste ano.

Instrumentos

O principal instrumento do Banco Central para conter a propagação da alta de preços é a taxa básica de juros, que é definida com base no sistema de metas de inflação. Quando a inflação está alta, o BC eleva a Selic, e a reduz quando as estimativas para a inflação estão em linha com as metas predeterminadas.

A instituição também pode atuar no mercado de câmbio, vendendo dólares nos mercados à vista e futuro, para impedir uma contaminação dos preços pela alta da moeda. Entretanto, o BC tem informado que suas atuações no mercado de câmbio visam apenas corrigir distorções e prover liquidez, não tendo como objetivo oficial conter a inflação.

Autoridades do BC afirmaram em diversas ocasiões, nos últimos meses, que seguem mirando na meta de inflação de 2022, ou seja, calibrando a taxa Selic para atingir o objetivo fixado para o próximo ano.

E, para isso, o Comitê de Política Monetária (Copom), que se reúne a cada 45 dias, tem optado por uma estratégia de gradualismo: aumento sucessivo dos juros em doses menores, ao invés de uma puxada maior de uma vez na taxa Selic.

O Copom começou a subir os juros em março de 2021, quando a taxa avançou para 2,75% ao ano (a primeira elevação em quase seis anos). Em outubro, na sexta alta seguida, a taxa avançou para 7,75% ao ano. O mercado prevê, até o momento, que a taxa avançará para 9,25% ao ano em dezembro, na última reunião do Copom em 2021, e para 11,25% ao ano até o fim de 2022.

BC independente
A previsão do mercado financeiro de que a instituição não será capaz de entregar, pelo segundo ano seguido, a inflação nas metas determinadas acontece logo no início da gestão do BC independente, aprovada no fim do ano passado pelo Congresso Nacional após um período de 30 anos de discussão.

A nova lei confere liberdade para o presidente e diretores da autoridade monetária subir os juros, se necessário, da forma como julgarem necessário. Isso porque o texto aprovado estabelece mandato de quatro anos para o presidente do BC e os demais diretores. Todos eles podem ser reconduzidos ao cargo, uma única vez, por igual período.

Cenário difícil
Analistas consultados pelo g1 avaliam que o cenário para a inflação está mais complicado desde a eclosão da pandemia da Covid-19, que gerou alta de preços de “commodities”, como alimentos e petróleo (combustíveis) não só no Brasil, mas pela economia mundial, além da falta de insumos e dificuldades de transporte. Outro fator que tem pressionado a inflação é a crise hídrica, com reflexo de alta no preço da energia elétrica.

Fatores políticos, por sua vez, também têm impulsionado os preços, pois pressionam o dólar. Nesse caso, os economistas citam a proposta, em discussão no Congresso Nacional, de rompimento do teto de gastos por meio da PEC dos precatórios que viabiliza o Auxílio Brasil e outros gastos. O texto passou no Senado Federal na semana passada, retornando à Câmara dos Deputados.

Segundo o economista-chefe da Necton, André Perfeito, esse é um “péssimo início” para um mandato independente do BC, que possui espaço para ser “bastante incisivo na politica monetária [definição de juros]”. Ele avaliou que o corte dos juros para 2% no ano passado foi um “experimento que talvez tenha sido ousado demais”.

Perfeito admitiu que elevações na taxa de juros, o principal instrumento do BC, não tem efeito sobre a alta dos preços dos alimentos, dos combustíveis e da energia, principal peso neste ano, e que a inflação também se ressente das tensões políticas para se gastar em um ano eleitoral – envolvendo o novo programa social, entre eles.

Mas avaliou que o BC poderia ser mais claro e direto em seus comunicados com as indicações sobre próximos passos da taxa de juros. “Talvez o instrumento não seja a taxa de juros, mas sim o comunicado. Passou o fiscal [gastos públicos] daqui, vou ter de reagir desse jeito. Se você governo fizer tal coisa, vou ter fazer tal coisa. Passou nessa linha vai ser tiro, porrada e bomba”, concluiu ele.

Para ex-diretor do Banco Central, Alexandre Schwartsman, será uma derrota para equipe econômica como um todo se a inflação ficar acima do teto de 5% em 2022, como projeta o mercado financeiro. Ele avaliou que isso também mostra que a credibilidade do BC “foi muito afetada”.

“Me parece muito claro que essa deterioração [das expectativas de inflação] acompanhou as perspectivas de piora do lado fiscal [contas públicas] (…) O problema não é o ano [de 2021], mas a perspectiva que vamos ter um quadro fiscal pior daqui pra frente. A gente não aprovou nenhuma reforma importante desde a previdenciária. Isso acaba levando a percepção que teremos problema com inflação à frente e os mercados antecipam, até na remarcação de preços”, disse.

Para o economista, os últimos indicadores inflacionários — como a alta no chamado índice de difusão (quantidade de itens afetados pela alta de preços), dos núcleos de inflação (que buscam captar tendência de preços, desconsiderando alguns itens, como alimentos e energia) e da inflação de serviços —, mostram que o período caracterizado principalmente por um choque de oferta (ausência de produtos por conta da Covid-19) passou e que a ideia de que uma alta de juros não pode trazer a inflação para baixo está equivocada.

“Olhando em retrospecto, o BC errou sim. Mas eu tive o mesmo erro. Minha leitura do processo inflacionário no final do ano passado e começo desse ano, e que foi a do BC, é que era um choque de oferta que seria transitório e que morreria em algum momento. Bastaria que os preços parassem de subir. É sempre mais fácil falar em retrocesso. Houve um erro, e o BC saiu correndo atrás [subindo o juros básico]. A ver se consegue entregar a inflação dentro do intervalo [das metas]”, disse Schwartsman.

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